Se falar sobre sexo ainda parece um tabu para muita gente – uma pesquisa desenvolvida pela empresa MindMiners, especializada em pesquisa digital, mostrou que metade das pessoas acredita que o Brasil seja um país conservador em relação ao sexo –, tratar do assunto quando o recorte são os idosos pode tornar o tema ainda mais difícil de ser abordado. A própria crença de que com a idade o desejo sexual diminui ou pode acabar contribui para que a sexualidade não seja uma temática muito comum relativamente aos idosos. “Ainda é algo muito pouco falado não só pela sociedade, mas pelos médicos também”, observa o sexólogo Rodrigo Torres. “Existe um preconceito social e uma estigmatização de que a pessoa mais velha não exerce a sexualidade e que não faz sexo, como ele fosse algo apenas fisiológico ou hormonal”, acrescenta.
Segundo o sexólogo, o etarismo – forma de discriminação baseada na idade das pessoas – também torna difícil a discussão sobre a sexualidade nas idades mais avançadas. “É algo que faz com que a pessoa mais velha se iniba ou desista de prazeres por conta de estigmas e preconceitos sociais ou até mesmo porque não foi incentivada a se estimular e se conhecer de outras formas”, afirma.
A sexóloga Enylda Motta reforça o coro, pontuando que a ideia de que as pessoas não fazem sexo na terceira idade ou que não sentem desejo permanece. “Mas isso não é real”, ressalta. A afirmação da especialista é corroborada por diferentes estudos, que mostram que a vida sexual continua ativa mesmo com o avançar dos anos. Um deles é um levantamento realizado em 2016 pelo Projeto Sexualidade (ProSex), do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Segundo a pesquisa, 66,7% das mulheres brasileiras com mais de 60 anos mantêm uma vida sexual ativa. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), citados no boletim Telessaúde do Governo da Bahia, em dezembro de 2022, também demonstram que a atividade sexual permanece para 74% dos homens e 56% das mulheres casadas com mais de 60 anos.
Mas, mesmo que a idade não seja um impedimento definitivo para o ato sexual, o avançar dos anos pode impactar fisicamente os corpos de homens e mulheres, tornando a relação sexual um pouco mais difícil e desconfortável. “Pode haver o ressecamento do canal vaginal pelo lado feminino. Já entre os homens, pode haver dificuldade de manter uma ereção, e isso pode ser causado por uma questão vascular ou até mesmo por medicações utilizadas”, explica Simone de Paula Pessoa Lima, médica geriatra da Saúde no Lar.
A situação, porém, pode ser melhorada com uma série de medidas. “Existe o gel vaginal, podem ser tentadas reposições hormonais, e, no caso dos homens, próteses penianas vão ajudar também, mas tudo vai depender, antes de tudo, da saúde física, da saúde mental e do próprio desejo do casal”, pondera. “É preciso fazer acompanhamento com o ginecologista e com o urologista para manter os órgãos o mais dentro da normalidade possível e cuidar da saúde como um todo. Porque a libido e o desejo têm muito mais a ver com a nossa saúde, inclusive mental, do que com a saúde da região vaginal ou peniana”, destaca a médica.
Algumas atitudes e comportamentos também podem ser adotados para que a sexualidade se mantenha. “O desejo deve ser cultivado ao longo da vida e na terceira idade também”, diz Enylda Motta, que orienta também que os casais passem tempo juntos, que namorem, busquem explorar o corpo e conversem sobre sexo.
Para o sexólogo Rodrigo Torres, é importante também problematizar o conceito que as pessoas têm sobre o sexo, entendendo-o apenas como o coito, como algo heteronormativo. “Quando a gente depende exclusivamente dos genitais para fazer sexo, pode-se entender que a pessoa idosa não fará, o que é outro mito também, porque eles não param de funcionar”, reitera. “É válido aprender a desenvolver e explorar o corpo como um todo, já que é possível sentir prazer em diferentes partes dele”.
Sexo faz bem para a saúde
A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece a sexualidade como um dos pilares para a qualidade de vida. A situação não é diferente na velhice, mas manter-se sexualmente ativo pode trazer ainda mais contribuições. Foi isso o que demonstrou uma pesquisa desenvolvida pelo Hope College em Michigan, nos Estados Unidos. Conforme o estudo, homens e mulheres com idades entre 62 e 74 anos que mantinham uma vida sexual “muito prazerosa e satisfatória” tinham melhores resultados em testes cognitivos do que aqueles que não tinham uma rotina sexual.
Ainda conforme o estudo, os resultados positivos podem ser justificados pelos benefícios do sexo no alívio do estresse na liberação da dopamina, conhecida também como “hormônio do prazer”. A pesquisa norte-americana foi feita com 1.683 pessoas, com 62 anos ou mais, e avaliou a saúde cognitiva em relação a seis áreas principais, que incluíam memória de trabalho, atenção e habilidades visuoespaciais.
Segundo Rodrigo Torres, o sexo também contribui para a melhora da autoestima do idoso. “Ele mantém a ideia de que eles merecem prazer, que merecem viver e que a vida não acaba com o envelhecimento. A saúde física e emocional também melhora, além dos relacionamentos interpessoais e afetivos, porque o sexo não é uma troca somente de estímulos genitais, mas pode ser também uma troca de afetos”.